Um dia após a aprovação da Lei nº 14.040, de 18 de agosto de 2020, que estabelece normas educacionais, em caráter excepcional, durante a pandemia, como a suspensão da obrigatoriedade do cumprimento da carga horária e dias letivos estabelecidos na educação infantil, assim como propõe que o Conselho Nacional de Educação (CNE) estabeleça diretrizes para a continuidade das atividades dado o contexto atual, a Fundação Abrinq realizou um webinar para refletir sobre o retorno às aulas em meio a pandemia.
O tema tem dividido opiniões e até gerado polêmica. Mas, afinal, é seguro retomar as atividades presenciais neste ano? Para responder esta pergunta e dialogar sobre todos os riscos que a reabertura das escolas pode ocasionar para a saúde de todos os envolvidos e todas as consequências educacionais que podem ser agravadas a longo prazo, a Fundação convidou a Dra. Ana Escobar, pediatra e professora livre docente da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e o Dr. Luiz Antonio Ferreira, conselheiro da Fundação Abrinq, promotor de justiça aposentado do Ministério Público do Estado de São Paulo, advogado e consultor, com atuação sólida na área da infância, juventude e educação para participarem da transmissão.
Para iniciar o debate, a Dra. Ana retratou a importância de se pensar nas diferentes faixas etárias, pessoas e situações que ultrapassam os muros escolares: “O cenário é muito complexo, muitas variáveis estão envolvidas nele, e a gente tem que pensar em cada situação. Pensando estritamente do ponto de vista da idade das crianças, sabemos que crianças pequenas, com menos de 2 anos, não devem usar máscaras e não têm noção nenhuma do que seja distanciamento social, portanto a volta às aulas nessa faixa etária será uma exposição dessas crianças ainda maior, não necessariamente a saúde das crianças, mas de seus familiares principalmente. Isso é uma coisa a ser levada em conta. Então precisa ver se essas crianças moram com quaisquer pessoas, no seu núcleo familiar, que estejam no grupo de risco ou não ou se elas próprias estão no grupo de risco”, explica.
“De 2 anos até o ensino fundamental as crianças já devem usar máscaras. É difícil fazer com que elas fiquem com a máscara o tempo todo na escola, mas entender o que significa distanciamento social para essas crianças também pode ter uma certa dificuldade, portanto também é necessário que as famílias, junto com a escola, considerem cada caso em especial. Agora crianças no ensino fundamental e no ensino médio já conseguem entender o significado e a importância de ficarem com a máscara e entendem perfeitamente a necessidade do distanciamento social. Então para essa faixa de crianças, nesse cenário de pandemia não controlada ainda, elas teriam mais segurança na volta às aulas”, completa.
Já o Dr. Luiz Antonio Ferreira alerta para a importância das escolas fazerem um diagnóstico em relação à aprendizagem dos alunos e um planejamento para a recuperação dos conteúdos.
“Mesmo em redes com alta capacidade de oferta e de ferramentas digitais e de efetivar parcerias como a rede estadual de São Paulo, os acessos não são igualitários para todos os estudantes. Então isso exigirá que cada escola olhe para o planejamento feito até aqui com relação ao currículo, para desenvolver um diagnóstico preciso. Ou seja, como estão os conhecimentos dos alunos, como vão planejar a recuperação, o que aprenderam, se eles tiveram acesso e se usaram o instrumental ou não, se vão começar de onde pararam ou se vão começar do zero. Nós vamos voltar e ter uma recuperação daquilo que já falamos, porque já tem estudos feitos que nas férias de verão nos Estados Unidos, 30 dias que os alunos ficam fora da escola, quando retornam, retornam com uma dificuldade muito grande, principalmente em matemática. Se em 30 dias ocorre isso, imagina no período que estamos aqui, desde março nessa situação”, relata.
Na ocasião, foram levantados questionamentos como a possibilidade de contágio com o retorno, os impactos da pandemia na educação, como garantir a segurança dos envolvidos na escola, se os protocolos e medidas sanitárias existentes são suficientes para garantir uma volta segura e responsável das aulas presenciais, entre outros.
“Nós precisamos ver a segurança das escolas, qual segurança elas oferecem para as crianças, seus professores, seus funcionários e consequentemente suas respectivas famílias. Porque todos estão envolvidos neste processo”, comenta a Dra. Ana Escobar.
E para finalizar, o Dr. Luiz Antonio Ferreira propôs uma reflexão sobre os novos costumes e a importância de ser solidário com o próximo:
“Eu termino aqui com uma reflexão do professor Boa Ventura de Souza Santos, que escreveu um artigo sobre a cruel pedagogia do vírus em que ele diz que a melhor maneira de sermos solidários uns com os outros é isolarmo-nos uns dos outros e nem sequer nos tocarmos. Eu não sei se vocês estão tendo tanta dificuldade como eu de não poder cumprimentar as pessoas adequadamente, mas isso é ser solidário e é isso que precisamos pensar como professor, como pai, como educador. Precisamos ser solidários, porque vamos ter que passar por esse processo”, finaliza.
Confira abaixo a conversa completa sobre o retorno às aulas em meio a pandemia.
Materiais complementares
Acesse os artigos escritos pelo Dr. Luiz Antonio Ferreira:
O Aluno com Deficiência e a Pandemia
A Volta às Aulas no Novo Normal
Confira outros artigos no site: www.miguelferreira.com.br